Historicamente, a cidade sempre dependeu do campo, de um entorno que a abastece de alimentos, água e ar limpo e que absorve seus efluentes, resíduos e emissões de escape. Esse entorno da cidade foi imaginado pelos projetistas das infraestruturas modernas como um quadro de referência estável, que poderia ser expandido ad infinitum. Os limites eram circunstanciais e tecnicamente ultrapassáveis. Todavia, o imaginado e o vivido não seguiram o mesmo caminho.
Em muitas cidades hoje, no Brasil e no mundo, enfrentamos problemas recorrentes de escassez de água, ar limpo e comida. Parecem momentos de fracasso local, de falta de planejamento e de modernização de infraestrutura. Mas, em suma, esses momentos provavelmente já anunciem as catástrofes da mudança climática por vir. No modo atual, não haverá recursos suficientes para resolver os problemas que vão surgir por todos os lados. As crises vão se tornar permanentes.
Do outro lado, existem inúmeros projetos experimentais de agricultura urbana, telhados verdes, captação de água de chuva, soluções para esgoto descentralizadas, dentre outros. O foco, parece, está no melhor aproveitamento de recursos e fluxos já existentes e nas tentativas de poluir menos o meio ambiente.
Qual será o ponto crítico para uma mudança mais estrutural a partir dessas experimentações? A floresta poderia ser um novo paradigma para as cidades? O que podemos aprender com a floresta, com as árvores, com os fungos, com sua parte invisível e subterrânea tanto quanto com sua exuberância verde na superfície? Que política urbana podemos praticar a partir da perspectiva da floresta?
A história e arqueologia da vida indígena na floresta amazônica mostram que a floresta nunca foi a selva do imaginário colonial. Sempre foi uma paisagem cultural habitada por várias espécies, dentre elas, os humanos. A cidade também nunca deixou de ser natureza, co-criação entre espécies. Se a natureza já sempre foi efeito simpoético, que futuro podemos construir e habitar a partir dessa observação? É possível retomar as cidades já existentes e organizá-las a partir de uma inteligência florestal?
Nesse sentido, CIDADE FLORESTA joga um olhar crítico sobre a economia verde emergente que promete soluções técnicas para os desafios do presente, sem questionar as relações que sustentam essas soluções. Mesmo uma economia que aproveita ao máximo os recursos à sua disposição, a chamada economia clímax, não resolveria a maneira como os valores assim produzidos são apropriados e distribuídos. A pobreza continuará sendo uma questão política, tanto quanto a segurança e o respeito às diferenças. É necessário ir além do melhor gerenciamento de recursos e sustentar um espaço político conquistado nas cidades.