Milena Manfredini

Cineasta, antropóloga, artista visual e curadora independente. Atualmente realiza sua pesquisa de mestrado no programa de Cultura e Territorialidades da UFF. Dirigiu os filmes “Eu Preciso Destas Palavras Escrita” (2017); “Camelôs” (2018); “Guardião dos Caminhos” (2019); “De um lado do Atlântico” (2020) e “Mãe Celina de Xangô” (2021). Tem produzido videoartes para museus e no momento está com 4 trabalhos comissionados pelo Museu de Arte do Rio, na exposição “Crônicas Cariocas”.

Revolver o passado para habitar o presente

Desnudar os véus que encobrem os cartões postais se faz necessário para compreendermos as memórias subterrâneas que, vez ou outra, emergem e se impõem diante de nós.

O quanto de passado existe em nosso presente? E o que fazemos com ele? Essas são algumas das perguntas que me mobilizam enquanto artista e antropóloga. E que tem a Região Portuária da cidade do Rio de Janeiro como território de irradiação para esta reflexão. O Cais do Valongo é reconhecido como o maior porto de receptação de africanos escravizados do mundo. Segundo alguns pesquisadores, por aqui aportaram mais de um milhão de pessoas em condição de escravizadas. Um número que, ainda hoje, ressona e revela as fraturas de nossa sociedade. Grada Kilomba, elucida em um de seus textos que o colonialismo é uma ferida que nunca foi tratada. Dói sempre, por vezes infecta, e outras vezes sangra. 

Desnudar os véus que encobrem os cartões postais se faz necessário para compreendermos as memórias subterrâneas que, vez ou outra, emergem e se impõem diante de nós. Em 2011, as terras revolvidas nas escavações do Cais do Valongo, nos revelou o quanto o solo e as pedras da região guardam em suas entranhas inúmeras cicatrizes. Objetos pessoais e sagrados trazidos por homens e mulheres escravizados nos navios negreiros permaneceram aterrados nas sucessivas transformações de modernizações urbanas da região, permanecendo submersos por mais de um século. As terras e as pedras do Cais do Valongo nos ensinam que, para habitar o presente, se faz necessário revolver o passado para ouvir e enxergar o que ele tem a nos dizer.

Realização

Produção