Condensador de dicotomias, o manto protege e revela, camufla e atrai, abriga e expõe. É roupa, como nos apresentamos ao mundo: as identidades que a gente assume e vai mobilizando na relação com o mundo. Convida à possibilidade da gente ir se vestindo e se despindo. Convida ao sonho, já que muitas imagens do manto vieram de sonhos, cujos conteúdos foram anotados e selecionados diariamente durante a Residência.
Convida, ainda, a essa possibilidade de vida que é a agricultura, em sua sacralidade tão humana. O Manto do Recolhimento é inspirado na agricultura urbana. Tudo que chamamos floresta, dentro e fora da cidade, são um presente ancestral, da agricultura, do manejo feito por gente que veio antes de nós, que hoje chamamos “povos tradicionais”.
Encontrar meios para a subjetividade ser expressa ainda parece ser uma coisa muito importante. Por isso, a necessidade de compartilhar em um ciclo de oficinas a potência transformadora da arte. A proposta se conecta também à minha pesquisa do doutorado em Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) sobre a produção de conhecimentos conectando arte, agricultura urbana e saúde coletiva.
Da dupla posição de artista visual e pesquisadora, investigo a arte na sua vocação de intervir na prática social. Uma ética da produção é sempre trazida à tona em meu processo de criação, para realizar um humano – no sentido dado por Paulo Freire, de humano como a dimensão de união amorosa entre a crítica e a beleza. Criticidade e boniteza de mãos dadas, em diálogo, e em dança. A criticidade (entendida como um viver político) unida à boniteza, entendida como um jeito de viver com os outros, em diálogo sensível, emocionado, esperançoso e utópico.